Entrevista con Magaly Pazello, de EMERGE - Centro de investigaciones y producción en comunicación y emergencia. Grupo de investigación vinculado al CNPq.
1. a. A RITS fez pesquisa em telecentros? Se sim, possuem informações sobre qual(is) seria(m) qual o(s) maior(es) programa(s) de telecentros no Brasil? Existem projetos federais de inclusão digital?
Veja eu não vou responder pela RITS, mas posso te adiantar algumas informações a respeito deste item, até porque eu realizei pesquisa, em 2004, sobre jovens, gênero e TICs e um dos projetos que eu visitei foi o programa telecentros de São Paulo no qual a RITS tinha um papel importante não tanto de pesquisa, mas a implementação de telecentros.
A Graciela participou de uma pesquisa realizada pelo IDRC (Canadá) sbre telecentros. Esta pesquisa foi feita no âmbito da Cúpula Mundial da Sociedade da Informação: http://ebook.telecentre.org/html/en/acknowledgements/
Até 2004 um dos maiores programas de telecentros do Brasil era mesmo o de São Paulo. É no âmbito do governo federal, no entanto, que se deram a mas importantes iniciativas de inclusão digital,: Casa Brasil, Telecentros, Pontos de Cultura, GESAC, etc.
Porém você também tem que considerar que há diferentes tipos de programas de inclusão digital no país. O trabalho efetuado por organizações não governamentais, por incentivos de fundações privadas e universidades deve ser posto na balança. O que falta é uma melhor integração desses programas no nível local e também superar algumas visões como, por exemplo: a) que os meninos são mais hábeis com as máquinas e, portanto, os espaços para eles são mais aceitos do que para as meninas; b) a idéia de que no acesso público da internet ou uso do computador tem que ser moralizado, quer dizer, ficam interditados, para os pobres ou aquelas pessoas que não tem acesso a computador e internet em casa, o uso de jogos ou de "distrações"; c) que
o conhecimento do computador é um dispositivo automático de acesso ao emprego.
Você possui informações sobre qual(is) seria(m) qual o(s) maior(es) programa(s) de telecentros no Brasil? Existem projetos federais de inclusão digital?
Eu ando bem desatualizada sobre as iniciativas hoje em dia. Mas posso de afirmar que durante o governo Lula os programas deram um grande salto a partir da base deixada pelo governo FHC. Outro ponto a se considerar é o fato de que as iniciativas no âmbito federal são bem descentralizadas e, de certo modo, foi essa descentralização que permitiu a maior penetração e autonomia dos grupos para que os programas fossem realizados, muitos de forma bem sucedida, outros "aos trancos e barrancos".
1. b. Como você analisa o uso da internet pelas mulheres no Brasil?
O interessante no Brasil é que vários dos dados coletados seja pela FGV ou pela PNAD são desagregados por sexo, porém não avançam para além da análise mais simples sobre como homens e mulheres estão posicionados na relação computador/internet/sociedade. No entanto estes dados são bem mais robustos do ponto de vista da pesquisa e da metodologia do que em outros lugares, de fato o Brasil já nesse campo.
Assim, é possível fazer uma pesquisa básica sobre a demografia da internet no Brasil. Eu teria que ver os dados atuais para ter uma idéia de como anda a coisa, mas posso adiantar que o Brasil tem dados semelhantes ao dos países de primeiro mundo no que tange o uso do computador e acesso à internet, são as classes mais altas e escolarizadas que se adaptam as novas tecnologias. Nesta camada a depender dos aspectos analisados as mulheres prevalecem numericamente sobre os homens. Mas é necessário realizar uma pesquisa mais fina sobre isso.
Eu não tenho acompanhado as últimas pesquisas relizadas no Brasil mas posso trazer alguns dados que eu acho interessantes.
Primeiro falar mulheres no Brasil é complicado porque as diferenças de classe e raça podem influenciar bastante nos resultados. As pesquisas que eu vi, sobre tudo a 2a edição da Pesquisa Sobre o Uso das Tecnologias da Informação e da Comunicação no Brasil, 2006 (CGI.BR) por exemplo não faz o corte de etnia/raça. O corte de sexo está concentrado sobre os totais e na apresentação da pesquisa não é possível desagregar o dado para as faixas etárias e níveis educacionais. Isto é um limitador da análise mais fina sobre o uso da internet pelas mulheres no Brasil.
Em 2006 qual era a situação geral apreendida pela pesquisa do CGI.BR?
i. Uso do computador
a) A diferença na proporção entre homens e mulheres que já utilizaram um computador não é muito significativa. Sendo que a maioria absoluta é formada por indivíduos com renda familiar acima de R$1.801,00 em 2005.
b) A diferença na freqüência de uso individual é sigificativa entre homens (55% do total de homens) e mulheres (47% do total de mulheres) que usam diariamente o computador. Os homens usam mais o computador diariamente em 2005.
c) Quando este uso era feito na escola/universidade o percentual de mulheres (21%) subia e relação aos homens (16%), ou seja mais mulheres faziam uso do computador no âmbito escolar. Também o uso do computador em telecentros e similares é levemente maior entre as mulheres.
ii. Acesso à internet:
a) Considerando o acesso à internet. Mais homens acessaram à Internet ao menos uma vez na vida do que as mulheres. E são as pessoas entre 10-34 anos as que mais usaram internet no país em 2005. Entre estas a faixa de maior prevalência é a de 16-24 anos.
b) Considerando o últimoa cesso realizado em menos de 3 meses, quer dizer nos últimos 3 meses a pessoa realizou ao menos um acesso à internet, são também os homens jovens que predominam.
c) Se tomamos o dado sobre o acesso diário à internet 50% do total dos homens usam internet diariamente contra 42% do total de mulheres, em 2005 quando se realizou a pesquisa. No entanto, quando o olhamos o dado do acesso diário observa-se que há uma mudanca de faixa etária que sobe, passando a prevalência para a faixa dos 16-59 anos, sendo que dos 45-59 é a que mais acessa.
d) Tomando os dados sobre o local de acesso, quase não há diferença entre homens e mulheres para o acesso em casa, mas as mulheres acessam mais à internet no âmbiente escolar e os homens fazem uso no trabalho.
e) Sobre o tempo gasto na Internet, as mulheres são maioria nos acessos com duração inferior a 1h, a medida que o tempo gasto na Internet aumenta essa proporção se inverte e passa a ser os homens os que mais gastam tempo na internet. Essa inversão se dá na faixa que vai de 11 horas semanais ou mais. Observa-se um equilíbrio na proporção homens/mulheres na faixa de 6-10 horas semanais empregadas para acessar a internet. Abaixo das 6 horas semanais são as mulheres as que prevalecem. Cruzando com outros dados pode-se depreender que nas faixas onde as famílias possuem computador e acesso à internet em casa as mulheres empregam menos tempo nesta atividade, o que pode indicar que tarefas domésticas consomem tempo livre das mulheres confirmando uma realidade que já conhecemos. No entanto, é necessário que os dados estejam mais desagregados para que cruzamentos mais detalhados possam informar melhor a análise.
f) Com relação às atividades realizadas na internet, as mulheres jovens de nível superior, aparentemente (outra vez os dados não estão desagregados nesse nível) são aquelas que mais utilizam a internet para educação ou estudos. O dado total da conta que 54% do total de todas as mulheres pesquisadas (todas as faixas de renda, idade, situação de emprego etc.) usam internet para estudos e educação contra 45% do total dos homens pesquisados.
Essa situação se inverte com relação ao uso da internet para fins de trabalho remunerado e negócios. O total de homens é de 34% para 24% do total de mulheres.
g) Nas atividades relacionadas à comunicação, as mulhers prevalecem no uso da internet para acessar o Orkut enquanto que os homens são maioria nas atividades que exigem mais conhecimento técnico como criar ou atualizar websites/blogs e usar VOIP (tipo skype).
h) A pesquisa de 2005 (publicada em 2006) também aponta algo que outras pesquisas já haviam encontrado: as mulheres usam a internet para informações sobre saúde, enquanto os homens são a maiorira no uso da internet para entretenimento e lazer.
Com relação ao lazer, o total de homens (45%) é bastante sigificativo com relação ao total de mulheres (28,50%) que utilizam a internet para jogar ou fazer downloads de jogos. Eles também são maioria (31% contra 21%) com relação a baixar música, filmes e softwares pela internet.
i) Com relação aos motivos pelos quais nunca se utilizou a internet os dados de 2005 são interessantes e é uma pena não tê-los em detalhe.
Os items que merecem atenção são:
Não sabe usar computadores 51,50% do total das mulheres afirma se este o motivo de nunca ter utilizado a internet, contra 50% do total dos homens. No entanto, 46% do total dos homens afirman que nunca utilizaram a internet por não ter necessidade ou interesse, contra 42,50% do total das mulheres entrevistadas. Essa leve diferença entre os sexos quando comparados dois motivos demosntra que as mulheres tem interesse mas afirmam não ter conhecimentos para fazer o uso da internet, ou seja, é a capacitação e o acesso aos recursos que pode elevar o percentual do uso da interne pelas mulheres. O mesmo já não ocorre com os homens entrevistados. Sobretudo considerando que no item "falta de habilidade com a internet" como motivo para não utilizá-la não diferenças entre homens e mulheres. Isto vai corroborar os dados sobre as diferenças entre homens e mulheres para buscar cursos e treinamentos em informática, as mulheres são aquelas que mais buscam estes cursos, os homens predominam entre aquelas pessoas que aprendem a usar o computador por conta própria ou com a ajuda de amigos.
O corte por classe social e faixa etária irá revelar dados muito interessantes sobre as razões de não utilizar a internet que não cabe aqui, neste moment, explorar. Mas vale sim a penar levar em consideração para uma pesquisa mais fina sobre o tema do acesso à internet e os motivos que levam homens e mulheres a utlizá-la. E as práticas desenvolvidas entre esses indicíduos. Claro considerando-se também os recortes de raça, idade, escolaridade e classe social.
Obs: os percentuais acima são aproximados.
Outros dados interssantes estão sendo coletados, por exemplo: Mulheres representam 51% das compras via internet (http://www.forumpcs.com.br/noticia.php?b=252084)
2. Como vê o uso de TIcs pelas organizações de mulheres?
É ainda muito limitado embora, em pesquisa recente realizada pelo NUPEF e coordenada por mim, cujo relatório final ainda não foi publicado, observou-se que a idéia de que o uso dos recursos estratégicos da Internet por parte dos grupos feministas no Brasil era tímido. No entanto, verificou-se que esta timidez não se caracterizava pela falta de engajamento, ao contrário, o movimento de mulheres, de uma ou outra maneira, fez uso desta ferramenta desde os primeiros momentos da Internet no Brasil. Recuperar esta informação vis-à-vis os usos estratégicos dos grupos “pró-vida” foi um importante achado da pesquisa. Outro achado relevante, e que tem haver com a pergunta anterior, é o de que a criação de espaços, para troca de experiências, livre de julgamentos de valor moral (tipo certo/errado) em ambientes virtuais públicos onde a adesão é voluntária, por exemplo o Orkut, contribui para uma conversação mais franca sobre os direitos reprodutivos e os problemas que as mulheres enfrentam nessa esfera.
De todo modo uma análise mais detalhada dos produtos digitais e do uso das ferramentas digitais pelas organizações de mulheres no Brasil revela que é aquém dos recursos que estas organizações poderiam realmente mobilizar e desenvolver. Falta colocar na agenda como prioridade o uso da internet para além de um mecanismo de divulgação. É necessário explorar as possibilidades com ativismo digital, mobilização da opinião pública, renovação de quadros, diálogo entre gerações e muitas outras ações que poderiam ser desenvolvidas.
3. Como vê o uso das TICs no combate ou promoção da VCM?
Também acho que muito mais poderia ser feito. Um primeiro passo seria mobilizar as ações off line com as ações online começando pelos dias de ativismo contra a VCM em novembro. Juntar o trabalho que organizações fazem online, por exemplo o trabalho junto com a campanha Take Back the Tech que tem no Brasil o apoio do g2g.
http://retomeatecnologia.info/
Esse tema precisa estrar para a agenda das ações de inclusão digital.
4. Quais as potencialidades e limitações do uso de TICs para combater a VCM?
Como potencialidade destaco a articulação entre mulheres, a troca de experiências e a construção de uma rede nacional de apoio as mulheres e meninas e por extensão meninos também que são vítimas da VCM quando no ambiente doméstico. O acesso aos meios de justiça e prevensão e programas de governo com redes de informação sobre direitos. As campanhas online, desenvolvimento de bancos de dados etc.
As limitações são as de que a tecnologia é mais um componente na mudança cultural, social e institucional necessária para o combate à VCM. Também a limitação a própria tecnologia e à internet limitam o alcance de ações mais dirigidas as mulheres e aos órgãos públicos.
5. Como usar TICs no combate a violência simbólica exercida também através do uso de TICs?
Eu defendo uma idéia que é a do selo de qualidade para produtos digitais começando pelos jogos. Outra coisa é começar a discutir mais seriamente a violência simbólica e a violência direta no setor econômico assim como no campo intelectual relacionado as TICs. Estas idéias de que software é coisa para macho realmente é o fim da picada.
O primeiro passo é divulgar o que já existe e ampliar as pesquisa sobre a história das mulheres para o desenvolvimento da computação desde Ada Lovelace até os dias de hoje e os embates e dramas pessoais, políticos, filosóficos e econômicos que estas mulheres enfretaram para realizar seus trabalhos com computação. http://www.scielo.br/pdf/cpa/n27/32144.pdf
6. Qual recomendações à SC e ao governo brasileiro sobre o uso de TICs nas políticas publicas especificas para mulheres, especialmente combate, prevenção e denuncia da violência domestica e familiar?
Eu não tenho agora em mente nenhuma ação específica mas acho que há de se aprimorar os serviços de e-gov com esta perspectiva. E também incentivar pesquisa no campo.
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